Like The Renegades!

maio 21, 2012

A Jaula

Sentia-me bestialmente leve. Tão leve que apostava que se uma breve brisa soprasse eu seria arrastado como uma pena. Sentia-me estranhamente bem. Não sentia as dores acutilantes que me faziam querer morrer assolar-me sem pedir permissão, não ouvia os passos inquietantes das pessoas ao longo do corredor infinito. Não ouvia os queixumes dos outros e eu próprio não tinha que me queixar. O cenário hediondo e decrépito tinha dado lugar a um cenário resplandecente. O sol brilhava tanto que ofuscava a minha visão. O vento leve e refrescante trespassava o meu corpo e sentia a planta dos meus pés fresca quando entrava em contacto com o solo meio húmido. Não tardei a correr. Sentia-me livre como um pássaro que esteve preso durante anos a fio e só me apetecia correr. Correr para o infinito sem pensar em destinos, problemas ou qualquer outra coisa que me costumava atormentar.
Cheguei a um imenso desfiladeiro onde o som de uma nascente a cair em catadupa se fazia ouvir. Um som suave, revitalizante que me queria fazer perpetuar aquele momento. Há anos que não me sentia tão livre de todos os meus problemas constantes. Há anos que vivia sob stress que me desconcertava e me fazia ser uma pessoa que eu próprio não conhecia. Há anos que me sentia um pássaro enjaulado sem esperança de me libertar. 
Ouvi uma voz. Estaquei, escutei e segui o meu instinto e cheguei a uma clareira. A voz sussurrou o meu nome levemente. 
Liam. Liam. Liam., sussurrava levemente a voz sumptuosa feminina.
Instintivamente continuei a segui-la até que a voz ia sendo inexoravelmente revezada por uma voz semelhante à dos filmes de terror. Comandei o meu cérebro a recuar, mas ele executava a ordem contrária e a outrora luminosidade foi abruptamente substituída por um cenário apocalíptico, onde grandes labaredas se elevavam mesmo à minha frente, assemelhando-se ao Inferno na Terra. Recuei o mais que pude, mas elas iam crescendo cada vez mais, encurralando-me. Enjaulando-me novamente. De repente, uma fagulha caiu nas minhas calças de ganga e comecei a pegar fogo. Corri desalmadamente aos gritos, pedindo por auxílio mesmo quando sabia que ele nunca viria. Clamei por ajuda mesmo sabendo que estava sozinho e que era um pássaro destinado a morrer sozinho.
Aturdido, com o corpo em combustão e a sentir a minha carne derreter-se como se eu fosse plástico, corri até ao desfiladeiro. Não hesitei. As dores eram dilacerantes e nada seria tão mau como estar a arder. Dei um passo em frente.
Acordei com uma agonizante dor no peito. Ardia-me como se estivesse em combustão. Descerrei as minhas pálpebras e deparei-me com o mesmo cenário de há um ano: o mesmo quarto de hospital cinzento, sem vida, sem qualquer alma viva por perto e... enjaulado para o resto da vida. 

Hayley Logan, One Shot Semanal

1 comentário:

  1. OMG OMG OMG! Quantos gostos posso por nisto??! Está perfeito! Adoro as descrições que imperam ao longo de todo o texto. A forma como expões o cenário , ao ponto de eu quase me ver inserida nele, ao ponto de eu poder visualizar com precisão tudo o que procuraste aqui expressar! Parabéns, Hayley, mais uma vez! Está... soberbo! :o
    beijo.

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