9-02-2012
Querido Diário,
Não ligues às lágrimas que já jorram dos meus olhos e que mancham as tuas páginas. Não me consigo conter, e preciso mesmo de desabafar, contigo. És só o que me resta, um caderno com rabiscos, as folhas rasgadas pela minha violência e molhadas pelas minhas lágrimas. Tudo o resto se foi. Voou. Para longe. Tudo o que tenho são memórias que consegui registar, tudo o que ainda me resta é um punhado de sensações que me percorrem. Não são positivas. Há muito que não valem o valor que lhes dou.
Está frio aqui fora. Os meus ossos estão a enregelar com este clima glacial , mas não me posso dar ao luxo de me recolher para aquele inferno a que chamam de lar. Não é a minha casa! Nunca foi! Mas continuo a interrogar-me.. As mesmas perguntas de sempre, as mesmas que em ti registei centenas de vezes.
Que tenho eu de errado? Porque é que vim aqui parar e não estou em casa com alguém que me ame? Porque é que os meus pais me abandonaram como todos fazem? Bolas! Os outros são os outros! Amigos, conhecidos, pessoas passageiras. Mas os meus próprios pais? Eles deveriam amar-me! Ou estarei eu errada?
Estou desconexa da vida real, cercada por este grupo de pessoas conhecidas, que em nada se associam a mim. Nada me dizem. Também não quero que tenham nada a ver comigo. Estou aqui há tempo suficiente para saber que ao mínimo és logo enxovalhado pelas costas. Como fazem comigo. Como sempre fizeram.
Gritam, gozam, acusam, criticam. Não estamos todos no mesmo barco? Porque terei eu de ser diferente? Porque não passo à margem dos seus gostos? Porque tenho amor próprio e não pretendo deixá-lo a jazer pelo caminho? Por ter as minhas limitações? Porquê?
Um dia sairei daqui. Eu sei que sim. Um dia alguém vai gostar de mim e recolher-me na sua casa. Dar-me-ão o carinho que me faltou nos últimos anos. Olhar-me-ão nos olhos e dirão que sou o que de melhor lhes aconteceu. Comprar-me-ão o material novo para a escola e far-me-ão uma grande festa de aniversário. Vão acompanhar o meu crescimento e felicitar-me com o maior sorriso do mundo por ter entrado na faculdade. Amar-me-ão. Eu sei que sim. Quero acreditar que sim.
Mas porque é que esse dia não se apressa a chegar? Porque é que todos se recusam a adotar-me? Outra criança ficaria melindrada com a hipótese de ter sido adotada. Não eu. O que mais desejo é carinho, uma casa a que possa chamar minha e uma família que me adore incondicionalmente. É pedir demais? Será que é por isso que não resulta? Porque peço demais?
Quero mudar. Sair deste sítio. Mas já não estou tão certa de que conseguirei. Quero alguém. Amigos. Não é algo que exista aqui. Estou a cair. Nunca mais alcanço o fim, nunca mais chego ao ponto, nunca chegarei. Só quero abandonar tudo e voar. Como os pássaros. Livre. Fugir.
Chamam-me para dentro. Quero ficar aqui e continuar a escrever, mas começou a chover e já bastam as lágrimas que te deixaram as folhas nesse estado e esta tinta toda esborratada. Voltarei a escrever amanha, se sobreviver a mais um dia neste manicómio. E depois chamam-me louca a mim por não compactuar com eles! Pudera! São dementes sanguinários, sedentos de vitória!
Vou enfrentar novamente aqueles rostos vingativos, aqueles sorrisos amarelos e forçados, aqueles olhares furtivos. Vou sobreviver a mais um dia e depois a outro. Acredito que sairei daqui e um dia, o alvo de chacota serão eles, porque por mais diferente que eu possa ser, um dia serei feliz. Eu posso não dispor de uma perna, mas eles nunca irão dispor da felicidade.
*História totalmente fictícia,
falta de imaginação no auge.
Renegada às quintas,
Bree Emma Sommers :)
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